quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Frida Kahlo e as crianças - " Pés, para que os quero, se tenho asas para voar?"

No final de Julho fomos à exposição  "Frida  e Eu", uma mostra interativa que apresenta Frida Kahlo para crianças no Museu Histórico Nacional, na Praça XV.













As crianças chegaram aproveitando toda a imensidão do espaço externo do Museu. Correram, pularam, entraram, saíram, conversaram com os funcionários e se deliciaram no Pátio dos Canhões. Lanchamos nesse pátio e também participamos de uma brincadeira com dobraduras e cortes de papéis coloridos ao final da exposição.

 











 Na sala de exposição elas tiveram contato com a intensidade da vida e da obra da pintora mexicana. Sua vida, apesar de marcada pela dores e doenças, foi apresentada com suas cores e afetos.

 
Cada instalação permitia que as crianças entrassem em contato, através da experiência, com a história da pintora. Sua infância com poliomelite, seu acidente de bonde, sua família e  suas perdas foram colocadas ao alcance delas. Uma cama onde cada uma podia se deitar e desenhar um auto-retrato olhando para sua imagem no espelho, um baú com um esqueleto de espuma para ser montado e com as marcas do acidente sinalizadas com pequenos corações vermelhos, um jardim  com sons de pássaros para que pudessem imaginar a varanda de sua casa onde escrevia, um espelho com imãs coloridos para montar um quadro em torno da imagem refletida... pequenas particularidades da vida da pintora ali na mão de cada uma, para que pudessem conhecer através do sensível.

 

A educação sensível possibilita conhecer através das sensações, das emoções que sentimos ao olhar para uma obra, da conexão que fazemos com nossa vida cotidiana.  As crianças se interessaram muito e interagiram com a proposta de maneira deliciosa. Uma exposição que elas pegavam, criavam, desenhavam, montavam, olhavam, ouviam... Todos os sentidos sendo convocados a participarem efetivamente. Todos os sentidos sendo os condutores da informação para o corpo, alma e intelecto.
 

As crianças saíram atravessadas pela vida de uma mulher de um outro tempo e de um outro território, mas que elas se identificaram e demonstraram interesse para conhecer mais.

Na semana seguinte fizemos uma tarde com lanche mexicano, músicas da trilha sonora do filme da Frida, saias para dançarmos e livros com sua história, pinturas e fotografias. Sentimos que havia um desejo de mergulho nessa vida que foi apresentada na exposição.

Uma vida dura e densa, mas que não as assustou, não as paralisou ou pareceu longe e desinteressante. Ao contrário,se identificaram com ela, com seus bichos, suas cores vivas e desenhos de flores. Elas queriam saber detalhes do acidente, ver seus auto-retratos, ver sua casa, entender porque o bebê que ela esperava não nasceu vivo, fazer comentários sobre a beleza da Frida e a feiura do seu namorado (que rapidamente aprenderam o apelido de sapo-rã), achar engraçado o esqueleto que usa chapéu e sorri e demonstrar uma dúvida quando souberam que ela não mamou na sua mãe e sim em uma ama de leite.

Um mundo novo se abriu e elas queriam vê-lo. Viram os livros acompanhadas pela educadora que ia narrando alguns fatos e depois retornaram várias vezes, durante a tarde, sozinhas para folheá-los. Momentos de contemplação.

No dia seguinte uma criança chegou sem desfazer a sobrancelha que pintamos no dia anterior já nos sugerindo que ia ter mais história da Frida. Seguiram  vendo os livro e solicitando contorno para esse processo.

No terceiro dia, passeando pelas páginas que mostravam diversas fases de sua imagem,  surgiu um interesse em observar esses auto-retratos e a partir disso algumas crianças iniciaram uma construção dos seus auto-retratos. Pegaram papel e lápis e foram se olhar no espelho. Um processo leve para algumas e intenso para outras.
Segundo Vigotski: "Como toda vivência intensa, a vivência estética cria um
estado muito sensível para as ações posteriores e, naturalmente, nunca passa sem deixar marcas em nosso comportamento posterior."

Sendo assim, diante dessa vivência, sentimos como a arte pode nos emocionar, atravessar e nos mobilizar. Com uma mediação lúdica e interessante as crianças reconhecem os paralelos que a vida e a obra de uma artista fazem com a vida delas próprias. Frida Kahlo fala de dor, de amor, de maternidade, de finitude, de cores, de bichos, de alegria, de morte... As crianças se identificaram com sua linguagem e não tiveram medo da realidade apresentada. Acreditamos que isso se dá quando lhes é permitido fazer as perguntas que as agonizam, quando elas podem expressar suas emoções para buscar a compreensão do mundo que as cerca.


quinta-feira, 19 de maio de 2016

Museu do Amanhã















"Crianças alegres e felizes
Chegando encapuzados
Fofinhos todos
Pulando
Naquele espaço lindo
Brincando
Interessados curiosos
E amorosos e cuidados
Entre si
Enfim
Tínhamos nas mãos
O amanhã do museu
De hoje"




quarta-feira, 18 de maio de 2016

Aventuras no Parque

Em Maio as crianças da Casa Escola tiveram uma tarde novinha em folha para brincar com os amigos Aventureiros nos Jardins do Museu da República.  Aventureiros é um grupo de crianças entre 4 e 8 anos que se reúne algumas tardes por semana para brincar. Um coletivo que tem as queridas Carolina Figueiredo e Andrea Romero acompanhando suas aventuras.


Nós da Casa Escola, que já gostamos de uma novidade, ficamos curiosos para conhecer esse grupo e marcamos um encontro tarde dessas. Chegamos de mansinho, e, ali no parquinho, as crianças foram observando, sentindo que havia uma parceria entre as educadoras dos dois grupos e aos poucos reconhecendo o outro brincante.

Brinquedos pra brincar na areia atraíram uma aventureira, depois uma pista para carros desenhada com giz no chão ficou seduzindo quem passava por perto para se aproximar mais e brincar junto. Aos pouquinhos foram falando seus nomes, observando a movimentação dos mais velhos e se soltando.

Fomos para perto da nossa querida Tamarineira para fazer o lanche. Abrimos nossas cangas, lanches e curiosidades. "O que é isso?" "Você quer um tomatinho?" "Cada um traz seu lanche?" "Você gosta de tangerina?" "Ah, ele não gosta de fruta nenhuma..." E assim com perguntas e alegria as crianças e as educadoras foram conhecendo um pouco da dinâmica do outro grupo.

Depois do lanche começou a vontade de correr e aproveitar para se esconder na gruta com o lago que estava sem água. Apareceu um monstro incrível que vira monstro e vira gente! Uma gritaria: "monstro, monstro, monstro!" Pronto! Uma rodadinha e já começam todas a correr dele/a. Quer dizer, quase todos, os maiores querem saber é de atacar o monstro, de desafiá-lo... Mas de repente uma vozinha fala: "Maria, Maria, Maria!" e o monstro vai embora deixando no seu lugar a educadora fazendo todas darem risada com a transformação. As crianças devem ter repetido essas frases trinta vezes.
E  pulando de um degrau pra lá, subindo nas pedras pra cá, todas vão se reconhecendo na movimentação, na ocupação dos espaços e nas cumplicidades para fugir ou pegar o monstro.

Já sabem alguns nomes e se interessam por saber quem vem buscar,  por contar onde vão todos juntos tomar banho depois... Proseiam.

E o lago sem água tem uma pedra linda que eles nomearam de "sofá" e que serviu para aconchegá-los para ouvir uma história no final da tarde. Primeiro ficaram de longe ouvindo e depois se aproximaram e pediram mais histórias, reconheceram livros e contaram suas aventuras.





Um encontro potente que começou de mansinho e terminou com gostinho de quero mais.
Precisamos concretizar mais momentos como esse, aproximar os pontos dessa rede de coletivos no Rio de Janeiro e possibilitar que as crianças desbravem essa cidade muito bem acompanhadas.
Seguimos atentos ao que vem pela frente e assim nos aventuramos juntos.






quarta-feira, 4 de maio de 2016

Narrativas diárias

" É  a reflexão sobre a experiência que é formadora, não a experiência por si só."
                                                                                                                         (Antonio Novoa)

Essa frase nos leva para a necessidade de pensar em como refletir sobre a experiência.
A experiência da Casa Escola não é resumida em atividades, propostas pedagógicas e acompanhamento de resultados. Nossa experiência é a lida diária com as crianças e suas famílias, é a construção cotidiana e coletiva de um espaço físico que seja acolhedor e seguro, é o planejamento de encontros entre o coletivo, a natureza e outros corpos.

Uma experiência que está em movimento o tempo todo.
As crianças com suas dinâmicas pessoais e fases de desenvolvimento específicas suscitam estudos, perguntas e exigem dos adultos (mães e pais educadores) um olhar sensível para suas descobertas e seus interesses.
O adulto está em um processo interno de observação da criança, buscando abandonar seu olhar escolarizado de julgamento e  avaliação.  Um processo novo, recente e desafiador.

Começamos nossos encontros para estudo em 2013. Nesse período estávamos pesquisando pedagogias e práticas educativas que norteassem nosso trabalho e nos dedicamos a leituras, compartilhamentos, buscas de referências práticas dos nossos desejos.
Com o início das nossas atividades em 2014, elegemos a prática dos relatos diários como uma maneira de dar visibilidade para todos os envolvidos no processo  que acontecia cotidianamente.

Um relato que marcasse os detalhes do encontro, mas que também trouxesse os sentimentos da mãe/pai que estavam como educador do dia. Não bastava relacionar as atividades, as conversas entre as crianças, as pesquisas, as alegrias e os conflitos que elas experimentavam. O mais importante era relatar fazendo parte da vivência, deixando transbordar cada expectativa com sua luz e sua sombra.
Relatos começaram a emergir em nossas caixas de emails.  Cada um com sua cor, com sua presença específica. Alguns seguiram em silêncio.

Os relatos são fontes de aprofundamento da prática, permitem um olhada mais profunda sobre determinado assunto, sobre determinada sensação, que muitas vezes em reuniões passa longe. Os relatos tem a força de um diário, um diário que vai ser aberto, que vai ser lido por no mínimo dez olhares diferentes. O que cada um escreve pode ser tornar outra coisa, pois está diretamente ligado ao lugar de quem lê, por isso escrever é um ato de coragem. É lembrar o que sentiu e expor ao outro sua fragilidade, sua natureza.

Uma escrita de si sendo constantemente escrita e lida permite um autoconhecimento. Inúmeras vezes sentimos um esclarecimento vindo no tom que o outro escreve, um desabafo tardio, uma intolerância, um julgamento de si mesmo, uma ternura para olhar para  o outro, uma certeza de que estamos fazendo o que tem que ser feito. Falas, dúvidas, certeza, tristeza, alegria... relatos que
alimentam quem lê. Os registros deixam de ser um evento particular e se tornam experiência compartilhada.

Na Casa Escola temos muitas perspectivas diferentes. Cada pessoa tem um lugar de fala construído em cima da sua cultura, da sua história de vida, dos seus desejos e medos. A partir disso aprendemos muito exercitando a escuta, respeitando a fala e colocando novos paradigmas. Com a argumentação de que o tempo é curto, muitas vezes parar para relembrar como foi nosso dia com as crianças e compartilhar com os outros pais, pode se tornar uma tarefa a mais, um exercício árduo, uma cobrança.  Mas a importância desse fazer e refazer é inquestionável, por isso nossos relatos, registros de reuniões, fotos, textos e conversas permitem que possamos olhar para nosso percurso e avaliá-lo, não no sentido de estarmos certos ou errados, mas com o objetivo de crescermos juntos com a prática, de não estarmos fixados em alguma ideia ou teoria.

Nosso grupo é formado por interlocutores privilegiados e cada troca e sistematização permite que olhemos para nós mesmos dentro de um contexto muito rico e diverso. Fazer, registrar, refletir e re-fazer é a dinâmica de um processo coletivo de conhecimento. Nesse tecer coletivo se faz presente a importância das narrativas pessoais que rememoram atitudes e questionam modelos e práticas tão consolidadas. Passamos por algumas crises, alguns silêncios, mas mesmo o que é escolhido para não ser dito já nos diz alguma coisa.

Reflexão coletiva para repensar nossa prática, mudar algumas estratégias e consolidar parcerias com novas famílias. Iniciamos 2016 assim, pesquisando nossa própria história para elencar o que nos é caro e que não podemos deixar de mostrar. Podemos olhar para os erros e saber exatamente porque aconteceu, onde esquecemos de nos consultar, o que perdemos no caminho. Com essa olhada pra trás conseguimos organizar a casa, refinar o olhar, rever nossos objetivos.

Mas a falta de tempo segue na nossa cola e fazemos disso nossa desculpa para os silêncios. Precisamos partilhar mais. Precisamos nomear nossos sentimentos. Precisamos nos reconhecer na fala do outro.
Somos sensíveis, observadores e aproximamos o pensar do fazer a cada vez que olhamos criticamente para nossa prática.

Sigamos nesse caminho, pois para nossa experiência render frutos ela precisa acontecer sempre, ser sistematizada, visibilizada e sobretudo, ser coletiva.





sexta-feira, 11 de março de 2016

Casa Escola no Astrolábio

O Astrolábio, um portal digital do Instituto Tear, fez uma matéria sobre "Educação dos filhos, uma tarefa partilhada" e convidou o Coletivo Casa Escola para contar um pouco de sua experiência. Maria Rocha, educadora, mãe e uma das idealizadoras do projeto relata o percurso do coletivo nessa entrevista:
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Por Ana Emília
Dúvidas são frequentes quando o assunto é a educação dos filhos. Além da árdua tarefa de conciliar todos os afazeres cotidianos com a participação efetiva no processo de aprendizado, é desejo comum a todos os pais e/ou responsáveis buscar uma educação que permita uma proximidade entre a criança, a família e os educadores.
Pensando nessas questões, os pais e mães do “Casa Escola” buscaram uma alternativa colaborativa que favoreça a educação dos pequenos e a interação entre seus pares. O coletivo criou um projeto que privilegia o espaço-tempo educativo e de cuidado com as crianças, em atividades formuladas pela rede de pais participantes do projeto.  Desenvolvimento corporal, cognitivo e espiritual além do respeito aos ritmos individuais e  a diversidade são os guias dos trabalhos do “Casa Escola”, é com essas ferramentas que o grupo diz estimular a convivência com o coletivo e com a natureza.
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Confira a entrevista com Maria, uma das idealizadoras do projeto:
Quais eram os interesses, planos e angustias comuns ao grupo quando vocês decidiram se reunir para criar o casa Escola? Existia divergência de opiniões sobre a gestão do projeto?
Éramos três mulheres juntas em  pós graduação em Corpo, Diferenças e Educação. Tínhamos muito em comum, inclusive o fato de estarmos ao mesmo tempo gerando nossos primeiros filhos. Quando nossas crianças tinham um ano e meio aproximadamente, sentimos a necessidade de buscar um espaço coletivo com o qual pudéssemos dividir a educação e os cuidados dos nossos pequenos. As críticas ao espaço escolar tradicional eram comuns a estas três famílias e decidimos então optar por um caminho novo. Uma criação totalmente nova para todos nós, mas que desde sempre fez absoluto sentido. Ainda que não soubéssemos ao certo o caminho que trilharíamos, tínhamos algumas certezas em comum sobre o que não gostaríamos de reproduzir, sobre experiências que vivemos enquanto filhos, alunos ou professores e que não gostaríamos que fizessem parte do processo de aprendizagem dos nossos filhos.
Você poderia me dizer como é a rotina dos adultos e crianças dentro do Casa Escola? Como vocês se organizam?
Nos encontramos diariamente durante as tardes, de 13:30 a 18:30. Hoje estamos em dez famílias, onze crianças. Quando estamos em nosso espaço, em Santa Teresa, achamos três adultos um bom numero para estar com esta quantidade de crianças. Quando estamos fora, em passeios, temos um ou dois adultos a mais, dependendo do local. Destes adultos, dois são educadores fixos, duas mães do projeto que recebem salários para exercer esta função, e os outros são pais e mães que se revezam em sistema de escala.
Na divulgação da página de vocês, existe um marco, que define uma data de início e uma data de fim de ciclo do projeto (2014). O que mudou dessa data em diante? Quais as experiências vividas nesse ciclo vocês carregam na bagagem para serem usadas novamente?
Nosso processo começou em julho de 2013 quando iniciamos encontros que mesclavam estudo, diálogos, mas também experimentação e brincadeira. Trabalhamos em meio ao barulho, cuidando dos pequenos, deixando que eles brincassem. Entendemos que estávamos experimentando justamente a criação deste espaço/tempo que mescla criação, vivência, brincadeira, pesquisa… Durante o ano de 2014 nos encontramos diariamente na casa de uma das famílias do coletivo, éramos 6 famílias com crianças de um e dois anos. No primeiro semestre deste ano uma das famílias teve seu segundo filho e isso gerou um movimento que veio a ter reflexos importantes na nossa organização como um todo. No final do ano de 2014 esta família já estava se reunindo com outras 5 famílias e um grupo de bebês iniciou atividades diárias em fevereiro de 2015. A história linda que vivemos na casa da família que nos recebeu estava chegando ao fim, ao mesmo tempo que nossos anfitriões sentiam necessidade de retomar sua casa apenas como espaço íntimo, o coletivo sentia que um espaço específico para nossa atividade nos proporcionaria uma organização mais coerente com todo nosso pensamento acerca da prática educativa que nos propomos. A chegada de novas famílias ao coletivo nos proporcionou financeiramente este ganho. Desde julho de 2015 estamos convivendo neste espaço que pensamos e produzimos especialmente para nossa atividade.
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O Casa Escola se inspira em algum movimento ou método para a gestão do grupo?
Não nos inspiramos inicialmente em nenhum movimento específico. Nossa organização coletiva, e a certeza de que é possível convivermos em grupo em formatos mais democráticos, nos fizeram gerir desde o principio nosso projeto de forma horizontal fugindo do formato hierárquico no qual nossa sociedade ainda, predominantemente, se sustenta. Hoje, vivendo essa construção diariamente, percebemos sim semelhança com o formato das Escolas Democráticas. Temos um grupo adulto bastante diverso de formações e interesses e cada um dos envolvidos no projeto acaba tomando para si funções que vão além da participação na rotina com as crianças, atividades variadas que se fazem necessárias para nosso funcionamento pleno. As adaptações no espaço, a organização de eventos externos, o acompanhamento e planejamento das finanças, o planejamento das escalas de pais, as atualizações no blog, compras semanais, são algumas das tarefas existentes que demandam a organização do coletivo para que sejam supridas, e os adultos se encarregam das funções de acordo com sua identificação, interesse e disponibilidade. Assim como, tomaram a frente da prática diária com as crianças os adultos que têm interesse específico por esta parte. Esta gestão democrática é a única forma de nos organizarmos coletivamente em coerência com a prática que nos propomos todos os dias junto às crianças. Estamos na nossa rotina desinvestindo do formato autoritário e centralizador e isso vigora em todos os âmbitos do projeto.
Muitos de nós, ou quase toda a nossa geração, foi educada dentro dos padrões de uma escola tradicional. Como propõe Ana Thomas, “para uma educação renovada precisamos tirar a escola de dentro de nós”. Gostaria de saber se esse impasse, acerca dos modelos de educação que marcaram a trajetória da grande maioria das pessoas, surgiu em algum momento no Casa Escola. Caso os impasses estejam acontecido, qual foi a forma de lidar com ele?
Esta questão está absolutamente presente em nós. Foi muito rápido até percebermos que este olhar para nós adultos seria o grande desafio que nos moveria nesta jornada. Estamos diariamente refletindo sobre estes padrões que nos habitam e avaliando quais deles fazem sentido para nós e quais acabamos reproduzindo apenas por hábito. E a partir disso buscamos dialogar e criar saídas para as inúmeras situações cotidianas que um grupo de crianças entre um  e três  anos pode nos proporcionar. São sempre reuniões longas onde todos do coletivo estão presentes, visto que praticamente todos os adultos participam do rodízio de pais e desta forma lidam diariamente com as crianças dentro do ambiente da CasaEscola.
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Para conhecer mais do Astrolábio e Tear: http://institutotear.org.br

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Princesa Alafiá

Domingo, 29 de novembro de 2015, teve encontro no MAM!

Casa Escola conheceu a história da Princesa Alafiá.
Não é uma história comum,  apesar de iniciar com o famoso "era uma vez". Essa história conta a vida de uma mulher negra que nascida na África onde vivia como princesa do Reino de Daomé, foi trazida para o Brasil e escravizada. A escravidão só serviu para mostrar o quanto era imprescindível estar com os seus e que não poderia desistir. Fugiu e foi viver num Quilombo, onde lutou, se apaixonou, aprendeu batalhando e segue construindo sua vida de maneira distinta e corajosa.

Mais do que uma princesa, nossa querida Alafiá é uma guerreira, uma transgressora. Não tolera a submissão, não esmorece na solidão, busca aliados junto aos seus, não espera que um homem venha resolver seus problemas em troca de juras de felicidade eterna. Alafiá é uma mulher  negra real, contemporânea nossa. Está nas favelas, na militância, nas universidades. Está transgredindo a ordem de que toda a princesa tem que ser loura de olhos azuis.


Alafiá nasceu do fruto de uma pesquisa de Sinara Rúbia (http://sinararubia.blogspot.com.br/2013/05/o-conto-princesa-alafia.html), educadora social  que estuda a influência da literatura na vida das meninas negras. Sua pesquisa inicia numa escola e o resultado,  crianças negras que não se reconhecem nos contos de fadas, a faz questionar e se recusar a reproduzir essas histórias que não representam grande parte da população brasileira.

A partir daí cresce a Alafiá, pois o conto se transforma em oficina, encontros, mais pesquisa, detalhamento de resultados... Cada vez que conta a história, Sinara se depara com o racismo forte, massacrante, iniciado tão precocemente na educação infantil. No início as crianças não querem a princesa negra, mas ao final da história já se entusiasmam e com o trabalho pós contação da história vão se apaixonando por ela e se reconhecendo naquela personagem.


Um trabalho importantíssimo que é desenvolvido em parceira com Ludimila e Paulo que compõem o Grupo Cultural Vozes da África (https://www.facebook.com/GrupoCulturalVozesDaAfrica/)
O grupo trouxe a história até nós para nos ajudar na caminhada para entender e combater o racismo no espaço e relações da Casa Escola.
Ludmila fez uma pergunta para nós: " O que vocês estão fazendo para combater o racismo?"
Acreditamos que já estamos fazendo alguma coisa quando olhamos para ele em vez de negá-lo ou fingir que não existe. Sentimos que precisamos de apoio e rede para nos guiar nessa caminhada para que cada estratégia seja coerente com o que acreditamos.
A apresentação da Princesa Alafiá e todo seu processo nos ampliou a escuta e a vontade de seguir construindo uma educação que realmente respeite e valorize todas as pessoas.
Para o nosso grupo de crianças as mensagens transgressoras que a história passa são muito elaboradas e abstratas, mas fica a representação de uma mulher negra contando a sua vida, afirmando sua força e isso é o mais importante nessa fase. Ter a representatividade negra garantida em todos os espaços, especialmente na literatura, brinquedos e mídias que chegam até as crianças.
Uma princesa negra nos foi apresentada. Que venham mais!
Parabéns ao grupo e obrigada!